Thiago Almeida*
É notório nos últimos tempos, em especial com a aceleração das medidas de austeridade, que a educação pública, tanto no nível médio como superior, tem sofrido um enorme corte em seus investimentos. O Pibid, programa de iniciação à docência, foi extinto pelo Estado, deixando milhares de discentes dependentes de bolsas extremamente preocupados.
Dentro do cenário geral, temos uma conjuntura ainda mais alarmante, o projeto de reforma da educação (PL 6840/13) aumenta a desigualdade entre as escolas públicas e privadas e abrirá brechas para a privatização do ensino. Aliada a este, temos a PEC 55, cujo principal objetivo é limitar os gastos públicos pelas próximas duas décadas, o que significará a diminuição dos investimentos em saúde, educação e programas sociais ao longo dos anos. Por fim, temos ainda as reformas trabalhistas, previdenciária e de terceirização.
Além disso, as reformas educacionais impostas pelo governo atual fazem parte de um projeto de privatização presente historicamente na educação pública brasileira, promulgadas pelas ações de empresas privadas cada vez mais associadas aos interesses de lucro e expansão de seus conglomerados.
Todas essas mudanças, pelos projetos de austeridade, acabam criando consequências para a universidade pública, interferindo diretamente nas condições de vida e permanência do grande número de alunos, pertencentes aos novos grupos sociais (em maioria vulneráveis social e economicamente), que agora fazem parte do ambiente universitário.
Em 2016 houve a intensificação das mobilizações contra a precarização frente às medidas governamentais. A necessidade de tomar a iniciativa política no cenário atual é imperativa para os revolucionários. Os anos subsequentes foram desenvolvidos com importantes mobilizações de trabalhadores e estudantes, principalmente causadas pela conjuntura aberta pela reforma trabalhista, somada inclusive às mobilizações de funcionários públicos.
As reuniões e mobilizações envolvendo trabalhadores e estudantes dão vida a um movimento importante, para além de suas conquistas e protestos imediatos, sendo configuradas como processos importantes para o aprendizado organizacional e combativo da nossa classe. É na mobilização que se desenvolve o potencial criativo, no qual a classe oprimida e explorada descobre a extensão de sua própria força e nossos fracassos como revolucionários são revistos.
Porém, nessas mudanças de perfil de grupos sociais, precarização da universidade e mudança no modo com que o atual governo lida com as questões sociais e grupos políticos que constroem uma política fora do campo tradicional e não ligada às elites, o processo de mobilizações do Movimento Estudantil vem perdendo forças e se estagnando. Isso ocorre pela falta de poder político, que nos governos anteriores era maior, no sentido de que a universidade não deixava de ser um reduto eleitoral e de pressão política, frente a um governo populista que percebia (ainda que minimamente) a importância de manter suas bases.
Além disso, a legitimação e o poder, não só político, mas de influência, tem se perdido, seja pela crise das ciências humanas e sua utilidade frente às políticas cada vez mais voltadas para o lucro, em que a educação se torna um gasto e o investimento é voltado a cursos cada vez mais técnicos com retornos imediatos. O que se alia a movimentos que endossam o discurso anti-intelectual e de criação de uma imagem negativa do perfil dos universitários e da própria universidade como polo “doutrinador” e de gasto dos impostos públicos. E, por fim, os novos grupos sociais, que não detêm em seu universo de influência poder econômico e político constituído pela sua posição social e que produzem um conhecimento que muitas vezes subverte o status quo e a produção de conhecimento que legitimava e embaçava grupos de poder, ou seja, os alunos que compõem a universidade e consequentemente o Movimento Estudantil, não são os filhos da classe média e da alta elite econômica, que antes homogeneizavam o movimento e tinham uma ressonância herdada em suas posições políticas.
Com a falta de clareza em sua estratégia política, o ME, ou pelo menos a grande parcela dele, que denomino de ala “revolucionária” e classista, permitiu às alas do ME reformistas e eleitoreiras retomar a liderança da agenda política, novamente se voltando à institucionalidade, com vistas a canalizar o ímpeto progressista e reformista das demandas da rua, novamente para a arena do consenso e da política eleitoral.
De maneira nenhuma pretendo deslegitimar ou apagar a memória das mobilizações e ações presentes; diferente disso, aponto que as recentes mobilizações têm demonstrado uma alta capacidade de análise conjuntural, incluindo as denúncias frentes às mudanças políticas e suas consequências para os trabalhadores e estudantes. Porém, com as crescentes mobilizações, ficam evidentes as falhas na análise do próprio movimento, estratégia de atuação política e de defesa da própria base do movimento: a universidade.
No cenário óbvio de mudança geracional, político e social que vivemos em nossos espaços, se faz necessário que a esquerda volte às discussões com os colegas nos espaços organizacionais, assumindo juntos um processo de politização de nossa organização e ação política. Essa politização deve andar de mãos dadas com a abertura da discussão estratégica e programática do movimento estudantil, como um exercício para fortalecer nossa resistência, mas para isso a reorganização e o modo de se fazer movimento precisam passar por uma radical mudança dentro das organizações e espaços políticos do movimento.
Thiago Almeida é graduando do 3º ano em História na UFPR, atuante no movimento estudantil desde 2016.