Cancion por la unidad de Latino America
Música de Pablo Milanes e Chico Buarque de Hollanda
Voz: Chico Buarque de Hollanda e Milton Nascimento
Álbum: Clube da Esquina 2 – Milton Nascimento – 1978 – EMI
https://www.youtube.com/watch?v=Z2JZq7ARat8 (versão de Chico, 1978)
El nascimiento de un mundo
Se aplazó por un momento
Fue un breve lapso del tiempo
Del universo un segundo
Sin embargo parecia
Que todo se iba a acabar
Con la distância mortal
Que separó nuestras vidas
Realizavan la labor
De desunir nossas mãos
E fazer com que os irmãos
Se mirassem con temor
Cuando passaron los años
Se acumularam rancores
Se olvidaram os amores
Parecíamos extraños
Que distância tão sofrida
Que mundo tão separado
Jamás hubiera encontrado
Sin aportar nuevas vidas
E quem garante que a História
É carroça abandonada
Numa beira de estrada
Ou numa estação inglória
A História é um carro alegre
Cheia de um povo contente
Que atropela indiferente
Todo aquele que a negue
É um trem riscando os trilhos
Abrindo novos espaços
Acenando muitos braços
Balançando nossos filhos
Lo que brilla con luz própria
Nadie ló puede apagar
Su brillo puede alcanzar
La obscuridad de otras costas
Quem vai impedir que a chama
Saia iluminando o cenário
Saia incendiando o plenário
Saia inventando outra trama
Quem vai evitar que os ventos
Batam portas mal fechadas
Revirem terras mal socadas
E espalhem nossos lamentos
E enfim quem paga o pesar
Do tempo que se gastou
De las vidas que costó
De las que pode costar
Já foi lançada uma estrela
Pra quem souber enxergar
Pra quem quiser alcançar
E andar abraçado nela
Texto, por Martinha Vieira – professora, formada em Letras – Português pela UFPR, em 1989.
Pós-graduada em Currículo e Prática Educativa pela PUC-RJ – 2003 – e pela PUC-PR em Produção da Arte e Gestão da Cultura, 2014.
Uma estrela pra quem souber enxergar…
Vamos ambientar o início dessa prosa em 1983, Brasil ainda espreitando as frestas da abertura de fachada, sob os últimos suspiros da ditadura militar, com o desejo de eleições diretas na garganta. Cursava eu o 1º ano do EM. Aula de história pela primeira vez. Antes apenas Educação Moral e Cívica e Estudos Sociais, que se reduziam a bandeiras, armas, símbolos e hinos, números populacionais, nomes de estados, capitais e algumas informações geográficas descontextualizadas para decoreba.
Até então nunca havia pensado nas articulações que moviam o mundo, interesses que desenhavam a geopolítica e promoviam o caos em muitos lugares desse vasto mundo, causando e aprofundando desigualdades.
Então entra em cena o professor de História, trazendo luz sobre a obscuridade daquilo que até então todos colocavam debaixo do tapete ao obedecer a um currículo imposto e estrategicamente delineado para a alienação. A noção de que os fatos não corriam desvinculados, mas guardavam entre si profundas relações, trazia clareza sobre os desmandos de governantes e ditadores que sucateavam a esfera pública e usurpavam direitos fundamentais lesando seu povo. Era a origem do mal, a explicação do quando, como e porquê. Esse mal eu já sabia na pele, já o percebia bem perto nas desigualdades gritantes nas ruas da cidade. E viria a conhecê-lo agora com maior amplitude. Livros saltavam em minha mente recém-descoberta na sua capacidade de entender a engrenagem perversa do poder. Naquele tempo íamos à Biblioteca Pública para pesquisar. E numa dessas tardes de pesquisa, terminado o trabalho em grupo, minhas colegas foram embora e eu resolvi ficar para ler um pouco mais um livro que me despertara o interesse: América Latina – Dois Pontos, do jornalista Newton Carlos. Voltei nas tardes seguintes para ler mais. E fui retornando até completar a leitura. Não quis levar o livro para casa para não ter que dar explicações, já que meu pai era simpatizante do quase finado regime militar e sua herança. Naquelas tardes de leitura e nas aulas de História meus olhos foram se abrindo para além das fronteiras criadas e arraigadas pelo nacionalismo cego e pela doutrina de segurança nacional instaurada durante os amargos anos de horrores sob a baioneta do exército, horrores esses que também até o momento eu ignorava. Hora de sair da caixinha e entender que além das fronteiras havia gente que amargava a mesma fome e submissão que eu já percebia no meu entorno, e que a miséria de tão perto tinha conexões tão profundas com políticas importadas de tão longe. Comecei a entender que a pobreza de alguns tem sua raiz no enriquecimento exacerbado de outros. A ganância ganhava uma nova dimensão, indo além da simples cobiça infantil no contexto da doutrina cristã dos catecismos, apresentando-se a mim agora em dimensões gigantes, como o grande capital internacional e os grandes multimilionários do planeta, sobretudo dos EUA e Europa, que faziam das terras privilegiadas da América Latina a sua colônia de férias, e do povo o seu proletariado semiescravo. Exploração de recursos naturais e mão de obra multiplicavam as riquezas e o poder de poucos, que ancorados nos regimes de força tinham suas garantias sempre renovadas para dar continuidade ao trabalho sujo, gastando vidas numa orgia semelhante à dos imperadores romanos, gastando escravos para a sua locupletação. O trabalho sujo de “desunir nossas mãos, de fazer com que os irmãos se olhassem com temor”. E o nosso continente tão sofrido e tão separado por fronteiras estúpidas, num isolamento militarizado sob o rugido da besta fera à caça das bandeiras sociais e políticas que buscassem qualquer forma de liberdade ou justiça social, seguia banhado de sangue em nome de doutrinas nacionalistas a fim de preservar um território para a orgia das elites norte-americanas e dos seus alinhados ideológicos, capazes de destituir o próprio povo da sua dignidade, alijando seus direitos fundamentais e banalizando suas vidas.
A tomada de consciência foi um susto. Dos livros passei a buscar os discos em que se cantavam as vozes de latino America por justiça e liberdade. E nessas canções mais histórias, agora em versos e melodias que intensificavam o significado da dor, da ansiedade, dos desejos e sentimentos de irmãos separados por fronteiras. Versos e melodias que despertavam o sentido de pertencimento a algo maior. De início me chamaram a atenção as vozes cubanas de Pablo Milanes e a de Sylvio Rodriguez. E segui para a descoberta de Victor Jarra, Violeta Parra, Mercedes Sosa. Os grupos Tarancón e Raíces de America nessa época traziam à tona essas canções chilenas, argentinas, uruguaias, cubanas, principalmente da década de 1970, em que as ditaduras pesaram sobre os povos irmãos. Então conheci a Cancion por La Unidad Latino Americana, de Pablo Milanes, já adaptada por Chico Buarque de Hollanda e gravada por ele e Milton no álbum Clube da Esquina 2, que encontrei em um sebo onde fazia minhas incursões rotineiras em busca de joias raras de poesia e música que ampliassem meu olhar para a compreensão do mundo, da vida, da história de que me sentia agora tomar parte.
“E quem garante que a História/ É carroça abandonada/ Numa beira de estrada/Ou numa estação inglória”. Assim quiseram aqueles que plantaram a força bruta. Quiseram e continuam querendo um povo cego à sua própria existência, abrindo mão de seus direitos para exercitar a servidão ao capital e aos seus poucos detentores. Fomos treinados pra isso na escola estudando moral e cívica e outras banalidades impostas pelo regime militar. Somos treinados pra isso nos modelos econômicos neoliberais, como fiéis consumidores de produtos e ideias. Fomos treinados pra isso desde os primeiros passos do regime capitalista que estimula o individualismo, em que o outro é o inimigo, o competidor. Somos treinados pra isso nas igrejas, que brotam aos milhões como grandes negócios e fábrica de ignorância, segregação e adestramento.
No Brasil, bancadas – na casa onde deveria se legislar em favor do povo, que devido aos inúmeros treinos de cegueira e adestramento elege representantes dos interesses de corporações e instituições no mínimo duvidosas e/ou muito mal intencionadas, ou ainda perversas, – reinventam as estruturas ao seu favor. Essas bancadas buscam novamente o adestramento tendo como motor as escolas. Querem que a educação se preste ao trabalho sujo de anestesiamento ou ainda de violamento da consciência por meio de reformas chucras.
Como na canção pela unidade de nosso povo de Latino América, querem novamente uma política de vigilância, de fechamento de fronteiras entre os irmãos e sua abertura apenas às mega corporações e ideologias capitalistas e neocolonialistas. O golpe militar de 1964, no Brasil, foi crucial para a catástrofe política, social, econômica e humana que se deu na América Latina nos anos seguintes. E hoje, sob efeito da era Trump, novos golpes vêm sendo orquestrados e executados, agora travestidos de democracia, uma vez que brotam em parte das urnas, ou utilizando-se de forma escusa, distorcida e abusada, de elementos até mesmo da própria democracia, destituindo representantes eleitos pelo povo. Instaura-se um cenário de obscuridade, instabilidade e convulsão na América Latina, mais uma vez com um estratégico golpe no Brasil e na Colômbia.
Mas “quem garante que a História/ É carroça abandonada/Numa beira de estrada/Ou numa estação inglória”?
Na Argentina, a derrota de Macri, que endossou a política de Trump contra a Venezuela e que boicotou toda e qualquer iniciativa de aliança entre os países latino-americanos, carrega em si uma semente de esperança de que a roda possa girar novamente conduzida pela luz da compreensão, como “um trem riscando os trilhos/ Abrindo novos espaços/ Acenando muitos braços/ Balançando nossos filhos”.
As reações populares, ainda que reprimidas, marcam posição contra uma ofensiva estratégica norte-americana articulada por meio de corporações midiáticas, manipulação de organizações, pressões diplomáticas e outros mecanismos de controle. As reações são linguagens que revelam a espinha dorsal de um povo. São termômetros que medem a febre em convulsão de um corpo que tenta expelir o mal que o adoece. A febre aquece, incendeia. E “Quem vai impedir que a chama/ Saia iluminando o cenário/Saia incendiando o plenário/ Saia inventando outra trama”, inventando caminhos que podem ser desenhados para a unidade de nuestros pueblos, para que brilhem com luz própria, sem intervenções, buscando suas próprias soluções, para que nada os possa apagar e talvez até seu brilho iluminar a obscuridade de outras terras mal curadas, do que ficou mal resolvido, de gentes mal tratadas que até hoje pagam “o pesar do tempo que se gastou, das vidas que custou e das que pode custar”.
Para conhecer a versão original de 1976, de Pablo Milanes.
Cancion por la unidad latino americana
Música de Pablo Milanes
Voz: Pablo Milanes
Álbum: La vida no vale nada – Pablo Milanes – 1976
https://www.youtube.com/watch?v=zR9grCBssrk (original de 1976, Pablo)
El nacimiento de un mundo se aplazó por un momento
un breve lapso del tiempo, del universo un segundo.
Sin embargo parecía que todo se iba a acabar
con la distancia mortal que separó nuestras vidas.
Realizaron la labor de desunir nuestras manos
y a pesar de ser hermanos nos miramos con temor.
Cuando pasaron los años se acumularon rencores,
se olvidaron los amores, parecíamos extraños.
Qué distancia tan sufrida, que mundo tan separado
jamás hubiera encontrado sin aportar nuevas vidas.
Esclavo por una parte, servil criado por la otra,
es lo primero que nota el último en desatarse.
Explotando esta misión de verlo todo tan claro
un día se vio liberal por esta revolución.
Esto no fue un buen ejemplo para otros por liberar,
la nueva labor fue aislar bloqueando toda experiencia.
Lo que brilla con luz propia nadie lo puede apagar,
su brillo puede alcanzar la oscuridad de otras costas.
Qué pagará este pesar del tiempo que se perdió.
de las vidas que costó, de las que puede costar.
Lo pagará la unidad de los pueblos en cuestión,
y al que niegue esta razón la historia condenará.
La historia lleva su carro y a muchos nos montará,
por encima pasará de aquel que quiera negarlo.
Bolívar lanzó una estrella que junto a Martí brilló,
Fidel la dignificó para andar por estas tierras.
Bolívar lanzó una estrella que junto a Martí brilló,
Fidel la dignificó para andar por estas tierras.