
POUCO CASO E INÉPCIA DO GOVERNO EM RELAÇÃO À PANDEMIA APROFUNDAM CAOS SANITÁRIO E ECONÔMICO NO BRASIL
Número 28 – Abril/Maio de 2021
A pandemia de covid-19 trouxe vários desafios. Nos países que agiram a partir de preceitos científicos e com planejamento público e adotaram procedimentos como testagem e vacinação em massa, lockdowns seletivos aliados a estímulos fiscais consistentes e efetivos, a economia caminha para a recuperação em 2021, ao mesmo tempo em que caem as taxas de mortalidade.
Infelizmente, no Brasil, as medidas indicadas pelas autoridades sanitárias e organizações nacionais e internacionais foram negligenciadas sistematicamente. O governo federal nada fez para prevenir o contágio e a propagação do vírus: não realizou a testagem em massa, não restringiu atividades e nem mesmo comprou vacinas. Em relação à imunização, o país chegou a rejeitar a compra de um lote de 100 milhões de doses de vacinas em 2020. Recentemente, numa reunião da Organização Mundial de Saúde (OMS), o atual ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, apelou para que os países que possuem doses excedentes de vacinas façam doações ao Brasil. Agora, o governo também corre atrás para comprar as 100 milhões de vacinas, só que ao preço majorado em R$ 1 bilhão[1].
O Brasil, que representa cerca de 3% da população mundial, virou, juntamente com a Índia, o epicentro da pandemia. Segundo estimativas do Instituto de Métricas e Avaliação em Saúde (IHME, na sigla em inglês)[2], da Universidade de Washington, “os números reais, somadas as subnotificações, são significativamente piores”, o que significa que o país pode alcançar meio milhão de mortos por covid-19 ainda no primeiro semestre de 2021. As medidas sanitárias e emergenciais para mitigar o impacto da pandemia são lentas, tardias e, atualmente, menos efetivas do que as tomadas no ano passado. Segundo estimativa do Made (Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades), da Universidade de São Paulo (USP)[3], a redução do auxílio emergencial elevará a quantidade de pessoas pobres e extremamente pobres no Brasil. Os pobres, estimados em 61,1 milhões de pessoas, terão que sobreviver com R$ 15,63, e os extremamente pobres, 19,3 milhões de pessoas, com R$ 5,40. Essa população supera o número de ocupados no Brasil[4].
O gasto médio diário do Executivo Federal no combate à pandemia de covid, nos primeiros 100 dias de 2021, equivale a modestos 8,3% do gasto médio diário do ano passado. Dito de outra forma, o desembolso médio diário do governo entre 13 de março e 31 dezembro de 2020 foi 12 vezes maior do que em 2021, até 10 de maio[5]. O governo também vetou R$ 200 milhões que seriam investidos em pesquisa de vacina nacional contra a covid-19, desenvolvida por cientistas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (USP)[6], e atrasou a entrada em vigor de um reduzido auxílio emergencial e do Programa de Manutenção do Emprego e da Renda, renovado com valores irrisórios que vão de R$ 150,00 a R$ 350,00. Este último valor, destinado a famílias chefiadas por mães, equivale a pouco mais de 55% do valor de uma cesta básica suficiente para alimentar uma pessoa adulta por um mês em São Paulo[7]. Coibiu também a verba destinada à continuidade das obras da Faixa 1 do programa “Casa Verde e Amarela” (originalmente “Minha Casa, Minha Vida”), cujo orçamento, inicialmente previsto pelo Congresso Nacional em R$ 1,540 bilhão, foi praticamente zerado, para R$ 27 milhões – redução de R$ 1,513 bilhão, ou 98,2%.
A pandemia ainda ter deve muitos desdobramentos na saúde e também nas áreas social e econômica. Nesse sentido, os indicadores de velocidade e a abrangência do contágio do vírus, bem como da vacinação, são variáveis importantes para os cenários de curto e médio prazo de crescimento econômico. Somam-se a essas incertezas a instabilidade e as tensões políticas promovidas diariamente pelo governo federal contra o Congresso Nacional, o Judiciário e as instituições, de modo geral.
Cenário macropolítico
Ao anular a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, permitindo que ele retome os direitos políticos, o Supremo Tribunal Federal (STF) deflagrou a corrida para as eleições de 2022. Ainda que o cenário seja muito incerto, pela indefinição sobre outros possíveis candidatos, os partidos políticos se movimentam. Lula já traça uma agenda de conversas para a construção de uma futura composição com políticos de centro e centro-direita, como o ex-presidente José Sarney (MDB), o ex-presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM), e o presidente do PSD, Gilberto Kassab. Este último já ensaia o afastamento do PSD do governo de Jair Bolsonaro e busca a filiação de Rodrigo Maia e do prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, ao partido.
Por sua vez, Bolsonaro, após a criação da Comissão Parlamentar de Inquérito da Covid (CPI da Covid-19), no Senado Federal, intensificou a artilharia e as ameaças contra o Supremo Tribunal Federal (STF), governadores, Lula, o sistema eleitoral e os próprios membros da CPI. Em 1o de Maio, dia do(a) trabalhador(a), estimulou manifestações presenciais em várias capitais, com forte conotação reacionária e autoritária.
Cenário internacional
O nível de incertezas diante das novas mutações do coronavírus e da abrangência, velocidade e eficácia da vacinação ainda não permite asseverar uma superação da pandemia e recuperação da atividade econômica mundial em 2021. Contudo, países que enfrentaram a pandemia com protocolos rígidos de prevenção, testagem, lockdowns planejados e políticas econômicas anticíclicas dão melhores sinais de retomada da atividade.
A China, no primeiro trimestre de 2021, na comparação com o mesmo período de 2020, registrou crescimento recorde do Produto Interno Bruto (PIB), de 18,3%. Os Estados Unidos apresentaram crescimento anualizado de 6,4% no primeiro trimestre deste ano, segundo dados divulgados em 13 de maio, resultado de forte impulso do aumento do consumo. Já a economia da zona do euro registrou queda de 0,6% no primeiro trimestre de 2021. Segundo a agência de estatísticas Eurostat, o PIB dos 19 países da zona do euro assinalou o segundo trimestre seguido de queda, o que demonstra que o cenário é recessivo para toda a região.
Três aspectos no cenário internacional merecem destaque: 1) o plano emergencial e de estimulo à economia norte–americana, de US$ 1,9 trilhão. No total, já foram gastos em políticas anticíclicas e emergenciais de combate à cvid-19 cerca US$ 5 trilhões, 25% do PIB dos EUA. As principais medidas do programa são: cheque direto para as famílias, no valor de US$ 1.400 por pessoa; prorrogação do seguro-desemprego até setembro de 2021; crédito fiscal para cuidado de crianças; testagem, rastreamento de contatos e vacinação em massa (governo Biden superou a meta de vacinação em 100 dias, com mais de 200 milhões de vacinas aplicadas nos EUA; Estados e municípios, pequenas empresas e escolas (retomada das atividades) 2) a Cúpula do Clima convocada por Joe Biden, que reuniu, em abril de 2021, 40 líderes mundiais. Evento preparatório para as articulações que acontecerão na Conferência das Partes (COP-26), em novembro deste ano, em Glasgow, na Escócia. Essa reunião havida nos EUA merece destaque pela importância do tema, pelo retorno dos EUA ao debate sobre clima e meio ambiente, pelas cobranças ao Brasil e pelo descrédito em relação às promessas feitas pelo presidente brasileiro no evento; 3) a sinalização, no início de maio de 2021, de que os EUA pretendem apoiar as negociações na Organização Mundial do Comércio (OMC) para a quebra temporária de patentes, ou “suspensão de proteções de propriedade intelectual de vacinas contra a covid-19“. Ainda que existam inúmeros obstáculos para o desenvolvimento de vacinas, como a carência de insumos e o domínio ainda restrito de novas tecnologias, trata-se de um avanço, talvez o único jeito de reduzir mais rapidamente o número de mortes no mundo subdesenvolvido. Os países mais ricos detêm a grande maioria dos imunizantes disponíveis hoje. Até duas semanas atrás, cerca de 7% das vacinas tinham sido aplicadas em apenas 10 deles. O Brasil, que inicialmente havia se posicionado contra a quebra de patentes, após a decisão norte-americana, mudou de posição e passou a apoiar uma “terceira via”, que seria, segundo o Itamaraty, tentar, junto com a Organização Mundial de Comércio (OMC) e outros países interessados, ampliar a transferência de tecnologia dos imunizantes existentes para países que tenham condições de produzi-los. Especialistas da área de propriedade intelectual dizem que esse tipo de proposta, na prática, nunca funcionou[8].
Comportamento dos preços
Em abril, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IPCA-IBGE), indicador oficial da inflação, registrou alta de 0,31%, com desaceleração em relação a março (0,93%). De janeiro a abril de 2021, a inflação acumulada atingiu 2,37% e, nos últimos 12 meses, 6,76%. Dos nove grupos de produtos e serviços pesquisados, oito tiveram alta em abril. A exceção foi o grupo “Transportes”, com pequena deflação de – 0,08% no mês. A maior alta ocorreu no grupo “Saúde e cuidados pessoais”, com taxa de 1,19%, a que mais teve impacto sobre o índice. O grupo “Alimentação e Bebidas” apresentou a quarta maior alta (0,40%), mas, devido ao peso que possui no orçamento familiar, foi o segundo grupo com maior impacto no índice. No mês anterior, esse grupo tinha registrado alta de 0,13%.
A Pesquisa Nacional da Cesta Básica de Alimentos, realizada mensalmente pelo DIEESE em 17 capitais, capta a variação de preços de 13 produtos alimentícios[9]. Entre março e abril de 2021, o custo médio da cesta aumentou em 15 cidades e diminuiu em outras duas.
As maiores altas foram registradas em Campo Grande (6,02%), João Pessoa (2,41%), Vitória (2,36%) e Recife (2,21%). As capitais onde ocorreram as quedas foram Belém (-1,92%) e Salvador (-0,81%).
A cesta mais cara foi a de Florianópolis (R$ 634,53), seguida pelas de São Paulo (R$ 632,61), Porto Alegre (R$ 626,11) e Rio de Janeiro (R$ 622,04). Entre as cidades do Norte e Nordeste, a cesta com menor custo foi a de Salvador (R$ 457,56).
Com base na cesta mais cara que, em abril, foi a de Florianópolis, o DIEESE estima que o salário mínimo necessário deveria ser equivalente a R$ 5.330,69, valor que corresponde a 4,85vezes o piso nacional vigente, de R$ 1.100,00. O cálculo é feito levando em consideração uma família de quatro pessoas, com dois adultos e duas crianças. Em março, o valor do mínimo necessário deveria ter sido de R$ 5.315,74 ou 4,83 vezes o piso em vigor. A estimativa é feita levando em consideração uma família de quatro pessoas, com dois adultos e duas crianças, que, na hipótese, consomem como um adulto.
Aperto monetário – elevação da taxa de juros após seis anos
O Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central do Brasil, elevou a taxa básica de juros (taxa Selic) de 2,75% para 3,5% ao ano. É a segunda elevação dos juros desde julho de 2015. De acordo com o Copom, o aperto monetário nesse momento se impõe devido ao “prolongamento das políticas fiscais de resposta à pandemia que pioram a trajetória fiscal do país […]”, além de possíveis frustrações do mercado, em relação à continuidade das reformas”.
A primeira decisão do Copom “independente”[10] parece apontar para a continuidade de um padrão de atuação assimétrico, que expressa extrema preocupação em controlar a inflação, ainda que esse controle tenha efeitos nefastos sobre a economia e a geração de empregos.
Alguns especialistas apostam que o ciclo de aperto monetário, com elevação da taxa de juros, deve continuar em 2021. Os efeitos contracionistas dessa medida para a economia, já tão combalida, são negativos, e podem deprimir ainda mais a atividade econômica, ao invés de estimular a recuperação. O aumento da taxa de juros tem ainda como consequência a elevação da dívida pública, gerando impacto fiscal negativo.
O crédito tem papel fundamental na economia, sobretudo nesse momento em que a recuperação da atividade é tão urgente. Contudo, mesmo com a taxa básica de juros fixada em 3,5% ao ano – patamar historicamente baixo, para padrões brasileiros -, os juros oriundos de empréstimos com recursos livres continuam exorbitantes. Empréstimos livres são aqueles cujas taxas são definidas livremente entre os bancos e os consumidores, em geral, que incluem, entre outros, o cheque especial, o empréstimo consignado, o rotativo do cartão de crédito e o financiamento de veículos. Em março de 2021, a taxa de juros média para empréstimos com recursos livres foi de 33,7% ao ano (a.a.). Juros que variaram de 18,9%, em média, para o crédito consignado; 87,3% a.a., em média, para os empréstimos não consignados; chegando a 121% a.a., em média, para o crédito rotativo no cartão.
Atividade econômica
Os dados mensais sobre atividade econômica e o acumulado do ano e dos últimos 12 meses indicaram resultados divergentes: alguns segmentos crescem, outros registram queda, dependendo da base de comparação.
Segundo os dados da Pesquisa Industrial Mensal (PIM), do IBGE, a produção industrial registrou queda de 2,4% em março de 2021, na comparação com o mês anterior. Em relação a março de 2020, primeiro mês da decretação do estado de calamidade pública por causa da pandemia, a produção industrial avançou 10,5%. No acumulado de janeiro a março de 2021, comparado com igual período de 2020, o crescimento da indústria foi de 4,4% e, nos últimos 12 meses, em relação aos 12 meses anteriores, o segmento registrou queda de 3,1%. Entre maio e julho de 2020, a produção industrial cresceu de forma surpreendente, mas, a partir de agosto, reduziu o ritmo. Mesmo assim, os resultados do ano passado superaram o patamar pré–pandemia em 3,5% (acima de fevereiro de 2020). Contudo, os resultados negativos de fevereiro e março de 2021 praticamente zeraram os ganhos de 2020, ou seja, a produção industrial recuou aos patamares de fevereiro de 2020. Alguns aspectos contribuíram para esse arrefecimento da produção: os estímulos adotados para recuperar a economia em 2020 perderam força e demoraram cerca de quatro meses para serem reeditados em 2021; a elevação das taxas de desemprego; e problemas de estoque e fornecimento de insumos nacionais e estrangeiros. Os aspectos mencionados aqui, somados ao nível alarmante de contágio da pandemia, à morosidade na vacinação, ao aperto monetário, com elevação da taxa de juros e oscilações na taxa de câmbio, contribuem para um quadro preocupante sobre os rumos da produção industrial em 2021.
Segundo dados da Pesquisa Mensal de Comércio (PMC) do IBGE, as vendas no comércio varejista caíram 0,6% em março, após alta de 0,5% no mês anterior. É o terceiro resultado negativo nos últimos quatro meses. O varejo, que em fevereiro deste ano se encontrava 0,3% acima do patamar pré-pandemia, ficou 0,3% abaixo desse nível, em março. Com esse resultado, as vendas registram queda de 0,6% no primeiro trimestre e alta de 0,7% no acumulado em 12 meses. O recuo foi verificado em sete das oito atividades investigadas pelo IBGE. O principal impacto negativo no mês veio do setor de móveis e eletrodomésticos, cujas vendas caíram 22,0%, em março. Contudo, no confronto com março de 2020, o total das vendas no varejo cresceu 2,4%.
Entre as atividades com crescimento no comércio varejista estão: outros artigos de uso pessoal e doméstico (30,0%); artigos farmacêuticos, médicos, ortopédicos, de perfumaria e cosméticos (12,1%); móveis e eletrodomésticos (11,9%); e equipamentos e material para escritório, informática e comunicação (1,0%).
Desemprego
Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad-C), do IBGE, o número de desempregados(as) no Brasil atingiu 14,4 milhões de pessoas no trimestre encerrado em fevereiro de 2021. Eram 2,4 milhões de pessoas desocupadas a mais do que no trimestre encerrado em fevereiro do ano passado. Trata-se do maior contingente de desocupados(as) desde 2012, início da série histórica da pesquisa, divulgada em 30 de abril, pelo IBGE.
A população desalentada, ou seja, que, por algum motivo (falta de expectativa de obter trabalho no momento, doença, falta de dinheiro etc.), não buscou trabalho, mas que gostaria de conseguir uma vaga e estava disponível para trabalhar, alcançou perto de seis milhões de pessoas, maior patamar da série histórica da pesquisa. No confronto com o mesmo período do ano passado, houve acréscimo de 25,6%, ou 1,2 milhão de pessoas a mais nessa situação de desalento.
Havia 29,7 milhões de empregados(as) com carteira de trabalho assinada no setor privado (exclusive trabalhadores(as) doméstico (as), número que representa estabilidade diante do trimestre anterior e queda de 11,7% (menos 3,9 milhões de pessoas) em relação ao mesmo período de 2020.
O número de empregados(as) sem carteira assinada no setor privado (9,8 milhões de pessoas) ficou estável na comparação com o trimestre anterior e caiu -15,9% (1,8 milhão de pessoas a menos) no confronto com igual trimestre de 2020.
O número de trabalhadores(as) por conta própria (23,7 milhões) teve alta de 3,1% na comparação com o trimestre móvel anterior (mais 716 mil de pessoas), mas caiu 3,4% diante do mesmo período de 2020 (menos 824 mil pessoas).
A categoria de trabalhadores(as) doméstices(as) (4,9 milhões de pessoas) ficou estável em relação aos três meses anteriores, mas recuou 21,0% (1,3 milhão de pessoas a menos) em relação a igual período do ano passado.
A taxa de informalidade atingiu 39,6% da população ocupada. O número de informais chegou a 34,0 milhões de trabalhadores(as). No trimestre anterior, a taxa havia ficado em 39,1% e, no mesmo trimestre de 2020, em 40,6%.
O rendimento real habitual (R$ 2.520,00) caiu 2,5% diante do trimestre móvel anterior e ficou estável em relação ao mesmo trimestre de 2020. Já a massa de rendimentos real habitual (R$ 211,2 bilhões) ficou estável na comparação com o trimestre móvel anterior, mas caiu 7,4% diante de igual trimestre do ano passado (menos R$ 16,8 bilhões).
Negociações coletivas
A estagnação da atividade econômica, a alta inflação de alimentos, o desemprego elevado e a queda no número de greves[11] repercutiram nas negociações coletivas. Boletim produzido pelo DIEESE sobre negociações coletivas referentes à data-base março[12] revelou alto percentual de reajustes abaixo da inflação (63,9%), na comparação com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC-IBGE).
O percentual de reajustes iguais ao INPC cresceu cerca de 15 pontos percentuais (p.p.) em relação à data-base de fevereiro, passando de 11,7% para 26,5%; já os reajustes acima desse índice caíram cerca de 14 p.p. (de 23,5% para 9,3%). Até o momento, a distribuição dos reajustes salariais de 2021, em comparação com o INPC, está assim: 13% acima, 26% iguais e 61% abaixo da inflação em 12 meses, na data-base.
As negociações no setor industrial seguem com o maior número relativo de reajustes acima da inflação, no primeiro trimestre de 2021. Ainda assim, a variação real média dos reajustes no segmento (ou seja, descontada a inflação) é, até o momento, negativa (-0,31%). No comércio, que registra a segunda maior proporção de reajustes acima do INPC, a variação real média dos reajustes é de -0,39%. Nos serviços, setor em que negociações com resultados abaixo da inflação representam ¾ do total, a variação real média dos reajustes é de -0,74%.
Por região, o Sul apresentou os melhores resultados no país: pouco mais de ¼ das negociações resultou em aumentos reais aos salários e menos de 1/3 ficou abaixo da inflação. Por outro lado, Centro-Oeste e Sudeste registraram os maiores percentuais de reajustes abaixo do INPC (79,2% e 76,2%, respectivamente). Em relação à variação média real dos reajustes, o quadro atualizado é: Norte, -0,49%; Nordeste, -0,49%; Centro-Oeste, -0,99%; Sudeste, -0,76%; e Sul, -0,14%.
O balanço do primeiro quadrimestre de 2021 é de incertezas e volatilidade, devido ao grave quadro da pandemia e à inépcia do governo federal para coordenar e pensar estratégias e ações para lidar com o grave problema que o país enfrenta e acelerar a vacinação. Os desafios impostos pela crise sanitária são enormes para todos os países, mas aqueles que “aprenderam” com a pandemia esboçam sinais de recuperação da atividade, com o controle das mortes, dos contágios e a vacinação em massa. No Brasil, que já vinha com a economia praticamente estagnada há alguns anos, infelizmente, é possível afirmar que os efeitos sobre a população mais vulnerável e a atividade econômica devem se aprofundar ainda mais, caso o governo federal não mude a maneira de atuar diante da pandemia.
Referências bibliográficas
ACCIOLY, Dante. Gasto médio do governo com pandemia é 12 vezes menor em 2021. Senado Notícias, Brasília, DF, 12 abr. 2021. Disponível em:
https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2021/04/12/nos-primeiros-100-dias-do-ano-governo-gasta-12-vezes-menos-com-pandemia. Acesso em: maio 2021.
ASSIS, Moreira. Terceira via para patente de vacina nunca deu resultado até agora, diz diretor do Centro Sul. Valor Econômico: Mundo. São Paulo, 10 maio 2021. Disponível em: https://valor.globo.com/mundo/noticia/2021/05/10/terceira-via-para-patente-de-vacina-nunca-deu-resultado-at-agora-diz-diretor-do-centro-sul.ghtml. Acesso em: maio 2021.
DIEESE. Abril: cesta básica aumenta em 15 capitais. São Paulo: DIEESE, 07 maio 2021. (Nota à Imprensa). Disponível em: https://www.dieese.org.br/analisecestabasica/2021/202104cestabasica.pdf. Acesso em: maio 2021
DIEESE. Acordos tem melhores resultados que convenções. São Paulo: DIEESE, maio 2021. (De Olho nas Negociações, 7). Disponível em:
https://www.dieese.org.br/boletimnegociacao/2021/boletimnegociacao07.pdf. Acesso em: maio 2021.
DIEESE. Balanço das greves do primeiro semestre de 2020. São Paulo: DIEESE, 29 set. 2020. (Estudos e Pesquisas, 97). Disponível em: https://www.dieese.org.br/balancodasgreves/2020/estPesq97balancoGreves1semestre2020.html. Acesso em: maio 2021.
DIEESE. Com atraso de quatro meses, governo relança o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda. São Paulo: DIEESE, 30 abr. 2021. (Nota Técnica, 256). Disponível em:
https://www.dieese.org.br/notatecnica/2021/notaTec256programaManEmprego.html. Acesso em: maio 2021.
HALLAL, Mariana. Em nova oferta, Pfizer cobra R$ 1 bilhão a mais por vacinas: preço é 20% maior do que o primeiro contrato de compra de cem milhões de doses. Terra: Notícias, 07 maio 2021, Disponível em:
https://www.terra.com.br/noticias/coronavirus/em-nova-oferta-pfizer-cobra-r-1-bilhao-a-mais-por-vacinas,2bb97ef58e76bd89fb64d2240b4a2686m6q7yn1s.html. Acesso em: maio 2021.
NASSIF-PIRES, Luiza; CARDODO, Luísa; OLIVEIRA, Ana Luiza Matos de. Gênero e raça em evidência durante a pandemia no Brasil: o impacto do Auxílio Emergencial na pobreza e extrema. Nota de Política Econômica – Made, n. 10, 24 abr. 2021. Disponível em: https://madeusp.com.br/wp-content/uploads/2021/04/NPE-010-VF.pdf. Acesso em: maio 2021.
NUNES, Fernanda; RICCI, Francisco J.; GORZIZA< Amanda, et al. A tesoura seletiva do orçamento. Piauí: Folha de São Paulo, São Paulo, 03 maio 2021. Disponível em: https://piaui.folha.uol.com.br/tesoura-seletiva-do-orcamento/. Acesso em: maio 2021.
RODRIGUES, Fernando. Exigências da Pfizer para vender vacinas foram excluídas de MP do governo. Poder360. 03 fev. 2021. Disponível em: https://www.poder360.com.br/coronavirus/exigencias-da-pfizer-para-vender-vacinas-foram-excluidas-de-mp-do-governo/. Acesso em: maio 2021.
VALOR; AGÊNCIA BRASIL; NIKKEI ASIAN REVIEW. Coronavírus hoje: Brasil ultrapassa a marca de 15 milhões de infectados por covid-19 e volta a registrar aumento de novos casos. Valor Investe: Brasil e Política, São Paulo, 07 maio 2021. Disponível em:
[1] (HALLAL, 2021) (RODRIGUES, 2021)
[2] (VALOR, 2021)
[3] (NASSIF – PIRES, 2021)
[4] Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD-C), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de março de 2021.
[5] Enquanto o gasto médio diário entre 13 de março de 2020 e 31 de dezembro de 2020 foi de R$ 1,892 bilhão), o gasto médio diário nos primeiros 100 dias de 2021 foi de apenas R$ 157 milhões). (ACCIOLY, 2021) –
[6] Por outro lado, garantiu R$ 241 milhões para gastos do Ministério da Saúde com publicidade.
(NUNES et al., 2021)
[7] (DIEESE, 2021a.)
[8] (ASSIS, 2021)
[9] (DIEESE, 2021b.)
[10] Primeira reunião do Copom após a aprovação pelo Congresso Nacional da “independência” do Banco Central em relação ao governo.
[11] Segundo o DIEESE, o número de greves em 2020 (primeiro ano da pandemia) caiu 42%. (DIEESE, 2020)
[12] (DIEESE 2021c)
.